Nástio Mosquito, um artista multimídia e agitador cultural que teve seu trabalho entre os selecionados para a última Trienalle, ele mesmo de volta a Angola depois de anos na Inglaterra e abrindo o primeiro escritório de gestão de patrocínio cultural do país, foi quem melhor traduziu o espírito que move essa geração. "Meu país tem praticamente a minha idade, não é em qualquer lugar que se pode dizer isso. Quantos anos países como o Brasil levaram para encontrar seu rumo? Angola vai encontrar o seu próprio caminho, que não é nem virar uma Europa ou uma América. Angola vai ser Angola. Se o resultado de toda essa transformação vai ser bom ou ruim eu não sei, vou ter que esperar uns 20 anos pra ver."
Vai ter que dar dinheiro, branco!", gritava ainda o mais exaltado dos passageiros da van angolana enquanto continuávamos parados na estrada de lama. O motorista do candongueiro, que até ali estava preocupado apenas com o senhor que o sujou, ainda tentou colocar pressão. "Mas isso lá é maneira de dirigir?!"
Ouvindo meu sotaque brasileiro dizer de forma enfática, mas educada, que não daria porra nenhuma e que a última pessoa do mundo que poderia criticar alguém por dirigir de forma descuidada - o que nem era o caso - era um motorista de candongueiro, cantados em verso e prosa como os maiores facínoras do trânsito de Luanda, quatro dos cinco passageiros desistiram da argumentação, mas o mais exaltado partiu para cima de meu carro gritando que ia quebrar tudo. Antes que ele chegasse perto, larguei a embreagem e andei uns 50 metros para trás. Foi o suficiente para ele desistir da valentia e voltar, junto com seus colegas, para o Toyota Hiace azul e branco, sem Omo, dinheiro ou desculpas.
Depois de se acalmarem ainda tive que lidar com o senhor, que queria que eu lhe entregasse meus documentos e a chave do carro e fosse com ele até seu emprego dar explicações. Era quase uma ordem de prisão. Uniforme em Angola é poder ou ao menos quem os usa crê que seja. Mas valentia de angolano, sobretudo sem colegas ao redor para lhes dar confiança, é curta. Quando disse que de meu carro não sairia, mas que se ele realmente fizesse questão poderia fazer a gentileza de segui-lo até seu chefe para explicar a situação, não como obrigação, mas como um favor, ele se resignou e aceitou.
Fomos então até o porto de Luanda, onde não apenas contei a história ao chefe como tive que assinar um papel confirmando-a. O senhor ainda tentou me intimidar na frente do superior, usando a condição de oficial de imigração para exigir que lhe desse meu passaporte para averiguação. Diante de meu argumento de que nem no Brasil nem em Angola sujar alguém de lama é crime ou violação de qualquer lei de imigração, e que eu estava ali fazendo um favor e não sob ordem judicial, ele acabou capitulando e se conformando apenas com um pedido de desculpas. "Então me dê mil kuanzas [cerca de 13 dólares] para lavar meu carro", ainda tentou, como se a sujeira do automóvel fosse culpa minha e não das enlameadas ruas da cidade. "Desculpe, mas vou precisar do dinheiro para lavar o meu", respondi. Entrei no carro e parti.
Como bem colocou o escritor Agualusa, num e-mail de boas-vindas pouco depois de minha chegada a Angola: "Chegar em Luanda é um choque, mas depois a gente acostuma".
Vai ter que dar dinheiro, branco!", gritava ainda o mais exaltado dos passageiros da van angolana enquanto continuávamos parados na estrada de lama. O motorista do candongueiro, que até ali estava preocupado apenas com o senhor que o sujou, ainda tentou colocar pressão. "Mas isso lá é maneira de dirigir?!"
Ouvindo meu sotaque brasileiro dizer de forma enfática, mas educada, que não daria porra nenhuma e que a última pessoa do mundo que poderia criticar alguém por dirigir de forma descuidada - o que nem era o caso - era um motorista de candongueiro, cantados em verso e prosa como os maiores facínoras do trânsito de Luanda, quatro dos cinco passageiros desistiram da argumentação, mas o mais exaltado partiu para cima de meu carro gritando que ia quebrar tudo. Antes que ele chegasse perto, larguei a embreagem e andei uns 50 metros para trás. Foi o suficiente para ele desistir da valentia e voltar, junto com seus colegas, para o Toyota Hiace azul e branco, sem Omo, dinheiro ou desculpas.
Depois de se acalmarem ainda tive que lidar com o senhor, que queria que eu lhe entregasse meus documentos e a chave do carro e fosse com ele até seu emprego dar explicações. Era quase uma ordem de prisão. Uniforme em Angola é poder ou ao menos quem os usa crê que seja. Mas valentia de angolano, sobretudo sem colegas ao redor para lhes dar confiança, é curta. Quando disse que de meu carro não sairia, mas que se ele realmente fizesse questão poderia fazer a gentileza de segui-lo até seu chefe para explicar a situação, não como obrigação, mas como um favor, ele se resignou e aceitou.
Fomos então até o porto de Luanda, onde não apenas contei a história ao chefe como tive que assinar um papel confirmando-a. O senhor ainda tentou me intimidar na frente do superior, usando a condição de oficial de imigração para exigir que lhe desse meu passaporte para averiguação. Diante de meu argumento de que nem no Brasil nem em Angola sujar alguém de lama é crime ou violação de qualquer lei de imigração, e que eu estava ali fazendo um favor e não sob ordem judicial, ele acabou capitulando e se conformando apenas com um pedido de desculpas. "Então me dê mil kuanzas [cerca de 13 dólares] para lavar meu carro", ainda tentou, como se a sujeira do automóvel fosse culpa minha e não das enlameadas ruas da cidade. "Desculpe, mas vou precisar do dinheiro para lavar o meu", respondi. Entrei no carro e parti.
Como bem colocou o escritor Agualusa, num e-mail de boas-vindas pouco depois de minha chegada a Angola: "Chegar em Luanda é um choque, mas depois a gente acostuma".
OBS: Esta sequência de artigos (que termina com este post) não é da minha autoria. Reproduzo-o em meu blog simplesmente porque narra um conjunto de eventos caricato mas muito comum no dia-a-dia de Luanda. As reflexões feitas pelo autor no decorrer do artigo são pura e simplesmente de sua autoria. -- Mais uma vez dou credito ao autor André Vieira e a revista Rolling Stone.
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